Florisvaldo Matos – Um poema de carnaval

 

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Tela de Carybé

 

Oficina de Carnaval

Florisvaldo Mattos

 

 Desenrole as palavras como

 se fossem veste sobre a pele

 e escreva suas frases como

 se alisasse um rosto (assim

 como nesta hora fazem os negros

 melhor do que os brancos).

 Saiba traduzir o silêncio

 na face angustiada de quem

 está dentro ou fora das cordas.

 Escute o sussurro das mãos

 ébrias de luz, cor e afagos;

 não apenas a voz, mas também

 o sotaque rascante do asfalto.

 Fale a língua do chão.

 Percorra praças, avenidas, ruas,

 mas também vielas e camarotes.

 Apare o suor do folião-pipoca

 e o dos que saracoteiam, à força

 de uísque, vinho e espumantes.

 Tenha olhos para ver o que sonha

 o som, o ganido das guitarras,

 mas também os seus gritos,

 a luta ancestral dos tambores.

 Liberte-se da mornança displicente.

 Descomplique-se. Na ponta

 dos dedos, nas teclas, no “mouse”,

 onde olhos são acentos, digite

 almas, gestos, alegrias, dores.

 Seque a veia das drogas,

 extraia seiva dos murmúrios.

 Desenrole com os sentidos

 o turbante dos Filhos de Ghandi,

 o brilho das contas de seus colares,

desvende a trama da trança rastafári.

 Leve para o texto esta verdade:

 gestos pensados, maciez e doçuras

 proclamam Salvador capital da folia

 e da paz em corações aflitos.

 E faça tatuagens no computador.

Salvador, 16-02-07