O Desejo Reprimido no Sonho de Ubaldo

Marcel Franco da Silva¹

 O sonho está relacionado a uma “sequência de fenômenos psíquicos (imagens, atos, ideias, etc.) que involuntariamente ocorrem durante o sono” (FERREIRA, 2001, p. 645). Esse produto da mente é, sem dúvida, um tema que há muito tem sido pesquisado, visando, sobretudo, a resolução de problemas individuais e/ou da coletividade social. Todavia, deseja-se destacar aqui a importância do sonho enquanto um desejo reprimido, porque, “el sueño es la realización (disfrazada) de um deseo reprimido.” (FREUD, 1969, p. 340). Assim, lançamos mão dessa breve exposição para analisar o poema Sonho, de Cezar Ubaldo (2010):

Faz silêncio e ouve
a minha voz
no espírito de sua alma
versejando
sobre o seu ventre,
leito de pedra
e luz,
fonte do inatingível,
sonho!…

 Nesses versos ubaldianos encontra-se implicado o desejo, a fantasia sexual do eu-lírico, e, de acordo com Freud (1969), este Sonho indica uma vontade sexual reprimida ou, no mínimo, proibida. O eu-lírico pede silêncio a uma pessoa, para que ela possa ouvir no seu interior mais profundo a voz dele (“Faz silêncio e ouve/ a minha voz/ no espírito de sua alma). É possível indicar aí os preliminares de um ato sexual. Ou seja, pode-se interpretar que o eu-poético fala ou murmura ao ouvido de alguém, de modo a manifestar o seu libido sentiendi (“versejando/ sobre o seu ventre”), o qual é proibido em determinados contextos sociais.

É importante deixar claro que a teoria de Freud sobre os sonhos se baseia em quatro assertivas, a saber: 1. Os sonhos realizam desejos; 2. Sonhos são a realização disfarçada dos desejos; 3. Sonhos realizam, disfarçadamente, um desejo reprimido; 4. Sonhos realizam disfarçadamente um desejo reprimido e infantil. Dessas afirmações, foi ressaltada a 3ª para a compreensão do Sonho de Ubaldo, uma vez que a motivação do sonho evidenciado nos nove versos

…considerou tanto o motivo que o ocasionou quanto o que provocou distorções nele, ou seja, a censura. Como os sonhos disfarçam o desejo, eles não o deixam aparente ou manifesto. O que não aparece foi interditado pela parte consciente da mente. (AUBIN, 2002).

O desejo erótico disfarçado, “interditado pela parte consciente da mente”, é revelado no poema Sonho e tende a ser mais frequente, á medida que o poeta verseja sobre o ventre da mulher desejada, ou melhor, faz versos sobre um ventre que é “leito de (…) luz”, que é um caminho infinito, revigorante, que gera vida (dar à luz) e é fascinante por ser misterioso. Tudo isto, então, sempre elevará o poeta às novas aspirações, porque, na verdade, seu Sonho representa não só uma “fonte do inatingível” que se deseja conhecer por meio do sonho, mas é, de sobremaneira, uma fonte de inesgotável inspiração poética.

 Fonte: Portal Literal 

Observação: Encontrei o texto de Marcel Franco, sobre a poesia do poeta feirense Cezar Ubaldo, no site Portal Literal, do Pará. (Re)publico o mesmo aqui (com os devidos créditos), como homenagem ao nosso patrício.