Saturação!

Unimultiplicidade

                        Ana Carolina / Tom Zé

Neste Brasil corrupção
pontapé bundão puto saco de mau cheiro
do Acre ao Rio de Janeiro

Neste país de manda-chuvas
cheio de mãos e luvas
tem sempre alguém se dando bem
de São Paulo a Belém

Pego meu violão de guerra
pra responder essa sujeira
E como começo de caminho
quero a unimultiplicidade
onde cada homem é sozinho
a casa da humanidade

Não tenho nada na cabeça
a não ser o céu
não tenho nada por sapato
a não ser o passo

Neste país de pouca renda
senhoras costurando
pela injustiça vão rezando
da Bahia ao Espírito Santo

Brasília tem suas estradas
mas eu navego é noutras águas
E como começo de caminho
quero a unimultiplicidade
onde cada homem é sozinho
a casa da humanidade

 

Elisa Lucinda: protesto

 

 

Texto de Elisa Lucinda

 Meu coração está aos pulos!

Quantas vezes minha esperança será posta à prova?

Por quantas provas terá ela que passar?

Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, que reservo duramente para educar os meninos mais pobres que eu, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.

Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova? Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais?

É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.

Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e dos justos que os precederam: “Não roubarás”, “Devolva o lápis do coleguinha”, Esse apontador não é seu, minha filhinha”.

Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar.

Até habeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha ouvido falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará.  Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear:  mais honesta ainda vou ficar.

Só de sacanagem!

Dirão: “Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo o mundo rouba” e eu vou dizer: Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês.

Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau.

Dirão: “É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal”.

Eu direi: Não admito, minha esperança é imortal.

Eu repito,  ouviram? IMORTAL!

Sei que não dá para mudar o começo mas, se a gente quiser, vai dar para mudar o final!

 

 Elisa Lucinda

Elisa Lucinda nasceu em Vitória, no Espírito Santo, onde se formou em jornalismo e chegou a exercer a profissão. Em 1986, mudou-se para o Rio de Janeiro disposta a seguir a carreira de atriz  e ingressou no Curso de Interpretação Teatral da Casa de Artes de Laranjeiras. Trabalhou em algumas peças, como “Rosa, um Musical Brasileiro”, sob direção de Domingos de Oliveira, e “Bukowski, Bicho Solto no Mundo”, sob direção de Ticiana Studart. Integrou, o elenco de vários filmes, entre eles “A Causa Secreta”, de Sérgio Bianchi e também fez novelas e séries para a televisão. Além de escritora, Elisa Lucinda é professora universitária, atriz de teatro, televisão e cinema.