O homem e seu carnaval

 

Carlos Drummond de Antrade

 

Deus me abandonou

 no meio da orgia

 entre uma baiana e uma egípcia.

 Estou perdido.

 Sem olhos, sem boca

 sem dimensões.

 As fitas, as cores, os barulhos

 passam por mim de raspão.

 Pobre poesia.       

 

O pandeiro bate

 é dentro do peito

 mas ninguém percebe.

 Estou lívido, gago.

 Eternas namoradas

 riem para mim

 demonstrando os corpos,

 os dentes.

 Impossível perdoá-las,

 sequer esquecê-las.

 

Deus me abandonou

 no meio do rio.

 Estou me afogando

 peixes sulfúreos

 ondas de éter

 curvas curvas curvas

 bandeiras de préstitos

 pneus silenciosos

 grandes abraços largos espaços

 eternamente.