Aniversário de Salvador

 

SalvadorMarinaBahia

Estou com problemas na coluna; uma hérnia de disco que inferniza os meus dias e me transforma numa espécie de pessoa intocável. Passei o dia tentando escrever alguma coisa em homenagem à minha querida Salvador, sem sucesso. Decidi então homenagear a cidade no dia do seu aniversário de 365 anos, com fotos que fiz ao longo dos anos, principalmente imagens do mar, que são aquelas que embevecem meus olhos.

Saa  2009 332

SalvadorFaroll

Bomfim 2014 4061

SalvadorMarinaBahia

SalvadorPescaria

Saveiro 2014_4058

 SalvadorSMarcelo

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Dia da Mulher

 

Maria, Maria

É um dom, uma certa magia

Uma força que nos alerta

Uma mulher que merece

Viver e amar

Como outra qualquer

Do planeta

Maria, Maria

É o som, é a cor, é o suor

É a dose mais forte e lenta

De uma gente que rí

Quando deve chorar

E não vive, apenas aguenta

Mas é preciso ter força

É preciso ter raça

É preciso ter gana sempre

Quem traz no corpo a marca

Maria, Maria

Mistura a dor e a alegria

Mas é preciso ter manha

É preciso ter graça

É preciso ter sonho sempre

Quem traz na pele essa marca

Possui a estranha mania

De ter fé na vida….

Mas é preciso ter força

É preciso ter raça

É preciso ter gana sempre

Quem traz no corpo a marca

Maria, Maria

Mistura a dor e a alegria…

Mas é preciso ter manha

É preciso ter graça

É preciso ter sonho sempre

Quem traz na pele essa marca

Possui a estranha mania

De ter fé na vida….

(…)

Mas é preciso ter força

É preciso ter raça

É preciso ter gana sempre

Quem traz no corpo a marca

Maria, Maria

Mistura a dor e a alegria…

Mas é preciso ter manha

É preciso ter graça

É preciso ter sonho, sempre

Quem traz na pele essa marca

Possui a estranha mania

De ter fé na vida

(Milton Nascimento)

Evolução do carnaval da Bahia III

 

Os blocos de trios

Aurélio Schommer

O Bloco Internacionais é de 1962. A ele se seguiram o Corujas, em 1963, As Muquiranas, em 1966, Camaleão (1978), Eva e Cheiro de Amor (1980) e Crocodilo (1985), além de dezenas de outros. Se, no início, os trios viviam apenas de publicidade, com os blocos e suas cordas passaram a ter uma fonte de receita ainda mais significativa, chegando a faturar milhões em cada carnaval. Essa fórmula (trio + patrocínio + bloco com cordas) será igualmente exportada para micaretas e outras festas, multiplicando as receitas da indústria do carnaval baiano.

 Alguns blocos geram bandas, que gravam discos de grande sucesso. Nova fonte de receita e mais divulgação para a produção musical baiana, que atinge o auge nos últimos 30 anos. Por falar em música, o chamado axé não é um gênero, mas uma marca da música baiana que incluiu o frevo, o samba, o rock, o pop, a balada e, acreditem, marchas de bandas militares, onde se formaram muitos dos músicos que fariam os primeiros carnavais de trio. O axé é sobretudo a mistura de todos esses ritmos, reinventados. É criação permanente, a cada ano diferente, mas sempre respeitando a essência da forma de brincar em torno do trio elétrico, o seu dançar e pular típicos.

Nenhum grupo representa melhor o carnaval baiano atual do que a Timbalada, fundado em 1993 por Carlinhos Brown, que envolve a comunidade do Candeal. Nele, tudo se cria e recria com muita velocidade, com grande apuro técnico e artístico.

O modelo do carnaval baiano recebe muitas críticas de quem fica de fora da corda e até hoje não conseguiu emplacar com sucesso como espetáculo televisivo, residindo aí sua grande limitação. A grandiosidade dos trios e o fluxo de foliões, por outro lado, tornaram as ruas estreitas, apertadíssimas. A possibilidade de mudar o circuito para locais mais amplos, porém, é temida em função da perda de tradição que representaria. A rua faz parte do carnaval baiano desde os primeiros carros alegóricos, do corso.

Como preservar tradição, melhorar o acesso do público não pagante de abadás e camarotes, e ganhar espaço físico para o trio sem perda de identidade são desafios que se colocam para nosso carnaval. Mas a criatividade do baiano haverá de dar respostas satisfatórias, como sempre aconteceu. Surgido entre nós como divertimento da elite, imposto como alternativa organizada contra o violento entrudo, o carnaval tornou-se parte de nossa cultura, símbolo de nossa identidade étnica e fonte de atração de recursos e turistas. Preservar o que a festa tem de melhor e torná-la cada vez mais bonita e representativa de nossas raízes depende de nós.

 

 

Dodô Osmar e o frevo novo

“Todo mundo na praça e manda a gente sem graça pro salão”, diz o verso de Caetano Veloso. A metade do século XX está para chegar e o carnaval nas muitas praças populares, nos bairros e em alguns pontos do centro, vai se tornando manifestação de massa aceita e aplaudida, enquanto a elite tradicional mantém os bailes nos salões. O corso entra em decadência, mas será salvo por uma invenção que irá unir elite e povo num só carnaval: o trio elétrico.

 O trio é de 1951, obra do engenheiro Temístocles Aragão. Mas ele não teria criado a invenção se não fosse uma dupla inventar a guitarra elétrica brasileira (já existia nos Estados Unidos), adaptada a um automóvel, no ano anterior, obra de Adolfo Nascimento (Dodô) e Osmar Macedo, que também criaram o ritmo “frevo novo”, adaptação do tradicional ritmo pernambucano à nova instrumentação.

O sucesso da novidade foi instantâneo e não apenas mudou radicalmente o modo predominante de se brincar na Bahia como daria início, anos depois, à exportação da folia baiana para todo Brasil e exterior.

 O trio rompe os conceitos de espaços privados, pois atrás dele, pulando, vão gentes de todas as classes sociais, dançando e pulando de todas as maneiras possíveis, ao som de ritmos misturados, o que bem mais tarde será chamado de axé (em iorubá = energia vital).

 Mas o trio, para se impor, precisava de patrocínio. Em 1952, a Fratelli Vita, fábrica baiana de refrigerantes, patrocina Dodô e Osmar, que inauguram, no mesmo ano, o caminhão no lugar da picape e da “fubica”, como fora batizado o primeiro carro, um Ford 1929, da dupla. Nesse mesmo ano, surge a micareta de Feira de Santana, logo em seguida a de Alagoinhas, inspiradas pelas novidades.

 Assim, vitaminado pelos patrocínios e amado pelos foliões, o trio não para de crescer e caracteriza definitivamente o carnaval baiano aos olhos dos brasileiros e estrangeiros, que comparecem em grande número a nosso carnaval. O carnaval de trio, além das micaretas e outras festas, passa a ser a forma de festejar predominante de muitas outras cidades, todas tendo a Bahia como referência, um sucesso que enche de orgulho o povo baiano.

Aurélio Schommer –  É natural de Caxias do Sul – RS (1967), radicado em Salvador desde 1995, é escritor e vice-presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia. Em 2011, foi o curador da 1ª edição da Flica, de que é fundador e participante da curadoria. É ex-presidente da Câmara Bahiana do Livro – CBaL (gestão 2009/2010). Autor de “História do Brasil vira-lata” (Casarão do Verbo – 2012), tem oito títulos publicados, entre romances, relatos históricos, livro de contos e o Dicionário de Fetiches (2008), obra de referência. Participa de um quadro periódico sobre literatura na rádio Educadora, de Salvador.

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Evolução do carnaval da Bahia II

 

O carnaval dos afoxés, blocos, cordões e batucadas

                                                           Aurélio Schommer

Data de 1892 a primeira participação de descendentes de africanos no carnaval oficial da Bahia, através dos clubes Embaixada Africana e Pândegos d’África. Incentivada e saudada pela imprensa por conta do “bom comportamento” dos negros, a participação dos clubes africanizados seguia a linha de negar a bagunça do entrudo em nome da ordem dos desfiles. Nem todos os afrodescendentes, porém, podiam participar. Fazer parte de um clube era privilégio de mulatos de classe média.

Os demais afrodescendentes queriam brincar o carnaval a sua maneira, organizando-se em afoxés e “batuques”, como a mídia classificava as músicas tocadas por eles. Em 1905, a Polícia baixa portaria proibindo os “batuques”, fazendo cumpri-la com rigor.

A organização de blocos, cordões e batucadas foi a resposta popular às proibições. Eles desfilavam e promoviam bailes de rua nos bairros periféricos, na Baixa dos Sapateiros e Terreiro de Jesus, longe dos olhos da elite. Passaram a ser tolerados justamente por se distanciarem do centro, a área nobre entre o Campo Grande e a rua Chile, ocupada pelos corsos.

Com o decorrer da primeira metade do século XX, o patrocínio de casas comerciais e das primeiras emissoras de rádio baianas deu gás e aceitação aos blocos, onde o samba e outros ritmos apropriados ao predomínio dos instrumentos de percussão se destacavam como trilha sonora. A tradição chegou até nossos dias a partir deles, sendo os blocos afro e o chamado Carnaval Ouro Negro formas modernas de representar esses antigos carnavais populares.

Se o afoxé é uma tradição muito antiga, é com a criação do Filhos de Gandhi, em 1949, que ganha expressão de público e atrai a curiosidade e, mais adiante, a fidelidade de baianos e visitantes.

A partir dos anos 1970, surgem novos blocos afro, com refinada produção musical e a proposta de resgatar as raízes e o orgulho africanos de nossa gente. O Ilê Ayiê, da Liberdade, é de 1974. Com três mil componentes, 147 deles na bateria, enche as ruas do circuito oficial do carnaval. Mas é o Olodum, fundado em 1979 no Pelourinho, quem irá projetar essa forma de fazer música e carnaval para o mundo.

Foi um sucesso estrondoso, projetou o nome de nossa terra para a aldeia global, fenômeno de rápida disseminação, que contribui enormemente para a atração de turistas.

Logo houve a fusão entre trio e bloco afro, o que gerou novos sucessos, como o Araketu, fundado em 1980. Na medida desse sucesso, a baianidade passa a ser sinônimo de negritude, marca até hoje mantida.

 Aurélio Schommer – É natural de Caxias do Sul – RS (1967), radicado em Salvador desde 1995, é escritor e vice-presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia. Em 2011, foi o curador da 1ª edição da Flica, de que é fundador e participante da curadoria. É ex-presidente da Câmara Bahiana do Livro – CBaL (gestão 2009/2010). Autor de “História do Brasil vira-lata” (Casarão do Verbo – 2012), tem oito títulos publicados, entre romances, relatos históricos, livro de contos e o Dicionário de Fetiches (2008), obra de referência. Participa de um quadro periódico sobre literatura na rádio Educadora, de Salvador.