Palavra Cantada

 

Temos a satisfação de anunciar o III Encontro de Estudos da Palavra Cantada, uma promoção conjunta do Programa de Pós-graduação em Música da UNIRIO e do PACC – Programa Avançado de Cultura Contemporânea da UFRJ, com o apoio da CAPES, FAPERJ, UNIRIO, CNFCP/IPHAN e CAIXA Cultural RJ.

O evento acontecerá no Rio de Janeiro, de 23 a 26 de agosto, no Salão Pedro Calmon, Fórum de Ciência e Cultura, Campus da UFRJ na Urca.

O III Encontro de Estudos da Palavra Cantada tem como objetivo central promover a reflexão sobre as múltiplas e heterogêneas modalidades da palavra cantada – da mitopoética das sociedades tradicionais até a canção popular contemporânea –, a partir de abordagens que permitam apreender a interação entre suas dimensões verbal, musical, vocal e performática.

A conferência de abertura será proferida pelo professor e etnomusicólogo Anthony Seeger, da University of California em Los Angeles, cujas análises sobre as artes verbomusicais de povos indígenas do Brasil são referência para os interessados na matéria. No encerramento, teremos palestras do professor Stéphane Hirschi, da Université de Valenciennes, especialista nas relações entre poesia e canção; e do professor e compositor José Miguel Wisnik, amplamente reconhecido por seu trabalho criativo e investigativo nos domínios literários e musicais.

Além desses conferencistas, participarão do evento palestrantes de diversas áreas de estudo e atividade artística, representando 12 universidades e instituições culturais. Eles tratarão de um amplo leque de expressões da palavra cantada, em vários cenários sociais, discutindo associações entre letra e melodia, teorias da voz e da performance, problemas e modelos de análise, história da canção popular brasileira etc.

Após as sessões de palestras, nos quatro dias do evento, serão apresentados pequenos recitais de artistas que ilustram manifestações diferenciadas de palavra cantada, com usos originais ou específicos de palavra, música e voz.

Mais informações sobre o evento e sobre os procedimentos de inscrição, bem como a lista de palestrantes, com os títulos e resumos das palestras, podem ser encontradas na nossa página.

Comissão organizadora:

Profª Elizabeth Travassos (CLA-UNIRIO)

Profª Cláudia Neiva de Matos (UFF; PACC-UFRJ)

Profª Liv Sovik (ECO / PACC-UFRJ)

Poemas de Antônio Brasileiro

 

ESTUDO 165

 

Compor um homem

com suas tramas, seus dramas,

teogonias, gramáticas, soluços;

compor um homem,

do orvalho matinal compor um homem,

do céu cheio de estrelas, do mistério

do homem

compor o homem; compor um homem

da criança que há no homem, do homem

a adivinhar-se em antiqüíssimas retinas;

compor um homem

com seus soluços, gramáticas, teogonias

– e recitá-lo perante os outros homens.

 

 

LOUCURA E POESIA

 

Furtava as cores de todas as paisagens

que colhia.

Um dia morreu

e um arco-íris bebia

seus olhos.

 

MELOPÉIA

   

Ai esta vontade imensa de calar!

 

De esparramar o pó dos pensamentos

tão longa e longamente arquivados;

 

de apagar os rastos e os projetos

e incendiar a estante de mil livros;

 

de consumar o amor num esquecimento

geral, completa e desprendidamente –

 

ai, semear beldroegas na avenida

e apascentar rebanhos de mamutes;

 

ai, gargalhar nas noites novilunas

como se louco ou iluminado;

 

adormecer serenamente: nu,

liberto, vasto, inverossímil.

 

Ah esta vontade imensa de falar!

                  (Antônio Brasileiro)

 

Para ler mais sobre Antônio Brasileiro, clique aqui,  aqui  e aqui.

 

Um poema de Drummond

 

O amor antigo

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.

Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
o antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.

Mais ardente, mais pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.

(Carlos Drummond de Andrade)

 

Cora Coralina

Saber viver

Não sei… Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.

E isso não  é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura… Enquanto durar

Um poema de Juraci Dórea

 

POIESIS

                p/ Iderval Miranda

no divã o poeta

com sua gramática

e seu amargo sorriso.

(na vidraça a neblina

 com seus fantasmas

 e seu ambíguo caderno.)

lá fora

apenas um profundo silêncio

e  aquela pedra

aquela pedra (e)ternamente

       no meio do caminho.

1981  (Juraci Dórea)

Foto: Leni David