Artes plásticas, música e emoção – Uma noite imperdível

 

EXPOSIÇÃO 11 + 22 + 44 – Homenagem a Raul Seixas

 

Em 17 de agosto, no ateliê de Leonel Mattos Rio Vermelho -Salvador -, será realizada a exposição “11+22+44” em homenagem a Raulzito (Raul Seixas) e seus Panteras, banda que gravou o primeiro LP há quarenta e quatro anos!

Foram convidados 11 renomados artistas plásticos para uma exposição coletiva no ateliê do Rio Vermelho, para homenagear Raul Seixas nos 22 anos da sua morte, e os 44 anos do lançamento do primeiro LP!

Participarão da exposição: Almandrade, Bel Borba, Carlínio, Celso Cunha, Gustavo Moreno, Jayme Figura, Leonel Mattos, Miguel Cordeiro, Ramiro Bernabó, Ricardo Franco e Vauluizo Bezerra.

No vernissage os músicos, Carlos Eládio, Carleba e Mariano (formação original da banda Raulzito e seus Panteras), apresentarão performance e concerto de músicas da banda, ao vivo.

QUANDO –  Dia 17  a 31 de Agosto de 2011

ONDE – Ateliê de Leonel Mattos – Rua Guedes Cabral 155 em frente a Igreja de
Santana a nova

HORA – A Partir das 19 h até 22h

CONTATO – (71) 9961 7470 – 3019 4877

Leonel Mattos – Artista plástico e curador

 

Raul morreu. Raul vive. Em cada fã, admirador, ou entusiasta de suas revolucionárias idéias. Seria ele nosso Che Guevara tropical?

 

Raul e os Panteras (Mariano, Carleba e Carlos Eladio) se conheceram quando tinham aproximadamente 15 anos. Todos estudavam em boas escolas, mas queriam mais. Começaram a se reunir para discutir filosofia, sociologia, e acumularam forte bagagem cultural. Portanto hoje ao ouvir Raulzito solo ou com seus Panteras, prestem bastante atenção as letras, fruto destas leituras e questionamentos juvenis.A Escola de Frankfurt foi a mola propulsora inicial, mas o grupo queria saber de onde viemos, para onde vamos e o que estamos fazendo aqui. Complicado. Tarefa árdua para um grupo de jovens.

Vocês devem ter estranhado o título, mas é uma trilogia facilmente decifrável. Leonel Mattos, pintor e agitador cultural, velho fã de Raulzito, juntou 11 artistas plásticos para em seu atelier/galeria homenagear o mestre e seu grupo. No dia haverá um happening, concerto, jam session, dos Panteras que voltaram à estrada e estão gravando. Ah, faltou o 22 e o 44 e, por incrível que pareça, fazem 44 anos de gravação do primeiro LP (ainda lembram o que é isso??) Raulzito e seus Panteras. Deixei o 22 por último, pois ele faz referência aos anos que o mestre nos deixou. Sociedade Alternativa?

Nada mais contemporâneo para este mundo em crise. Seu hino, seu guia. Esta mescla de musica e artes plásticas tem por objetivo reacender o mito Raulzito e tentar fazer com que especialistas em música se interessem em fazer um estudo profundo do que ele foi para a musica brasileira, além da homenagem das artes plásticas.

O grupo tentou ir ao Sul Maravilha em busca do sucesso e como não conseguiu, talvez por estar ha anos-luz de sua época, ele se desintegrou. Raulzito, em carreira solo, ganhou um Festival da Canção, o que lhe proporcionou certa fama e status. Mas a mosca continuava voando.E os habitantes terrenos olhando estupefatos. Aos poucos ele se impôs e chegou a emplacar sucessos. Mas a doença que o perseguia, a mesma que matou Amy Winehouse, e está devidamente catalogada na OMS, o levou como um meteoro.

Hoje, todos os anos, no dia do aniversário de sua morte, os fãs se reúnem no cemitério da Saudade para cantar Raul. Também hoje em dia virou bordão nacional quando um show está ruim a platéia gritar:toca Raul! Os Panteras continuam na estrada e lá de cima Raul sorri e certamente grita: viva a sociedade alternativa!

Octaviano Moniz

Feira do Livro – A Feira e a Memória I

 

Roda: Memória e esquecimento

Mote: Percursos da memória, entre silêncios e esquecimentos

Provocadores: Clovis Ramaiana. UNEB – Campus Alagoinhas e Washington Queiroz – Membro do Conselho Nacional de Cultura

Debatedor: Juraci Dórea – UEFS

Local:  Auditório da Feira do Livro – Praça do Fórum

Dia: 18/08 as 14:00h.

Participação de cronistas, historiadores, literatos, memorialistas, poetas e quem mais se sentir convidado.

4ª Feira do Livro de Feira de Santana

 

 

A consolidação de uma política pública de fomento e valorização da leitura será uma das vertentes da 4ª Feira do Livro. O evento, promovido em parceria entre entidades de Feira de Santana e de Salvador, será realizado no período de 16 a 21 de agosto, na Praça do Fórum de Feira de Santana e terá como tema Memórias e Esquecimentos: Leitur@s.

A Feira tem como objetivo geral mobilizar a comunidade feirense e da região para a importância da leitura como elemento facilitador da compreensão do mundo e da participação de cada ser na construção coletiva da cidadania. Espera-se contribuir para articulação entre os diversos conhecimentos produzidos sobre leitura e formação do leitor.

Nascida do desejo de educadores em despertar os dirigentes de instâncias públicas, privadas e filantrópicas para a importância de implementar políticas públicas do livro e da leitura na sociedade, a Feira do Livro tem possibilitado o acesso de pessoas excluídas do universo da leitura e de atividades culturais.

O sonho de executar o evento se tornou realidade em 2008, graças à união de esforços da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Arquidiocese de Feira de Santana, Secretaria da Educação do Estado (Direc-02), Secretaria Municipal de Educação, Serviço Social do Comércio de Feira de Santana (Sesc), Serviço Social da Indústria de Feira de Santana (Sesi), Serviço Social do Transporte / Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Sest/- Senat) e Fundação Pedro Calmon.

Além da exposição e venda de livros, a Feira terá vasta programação que envolve lançamento de livros, contação de histórias e de causos, conversa com o escritor, mesas redondas e palestras, seminário, recitais, oficinas, teatro, música, exibição de filmes, biblioteca móvel e planetário (com participação do Observatório Antares).

A programação completa pode ser acessada no site. Outras informações pelo e-mail   e pelos telefones (75) 3161-8154 ou 3161-8254 e da Pró-Reitoria de Extensão da Uefs.

Ascom/Uefs

Festa da Irmandade da Boa Morte em Cachoeira

 

 

A Festa da Boa Morte acontece todos os anos na cidade de Cachoeira, no recôncavo baiano. Pensei em escrever alguma coisa sobre essa tradição, mas desisti do intento ao ler o texto que publico abaixo, escrito por Gustavo Falcon, pesquisador e professor da UFBa.

A Festa da Boa Morte ocorre desde 1820. A tradição foi reconhecida pelo governo como Patrimônio Imaterial da Bahia, em junho de 2010, passando a contar com o apoio do Estado. Este ano, o evento acontece a partir de hoje (13), até quarta-feira (17).

A Irmandade é composta por uma confraria de 23 mulheres, descendentes de escravos africanos e com mais de 50 anos de idade, unidas pela devoção a Nossa Senhora. De acordo com historiadores locais, a confraria surgiu quando um grupo de ex-escravas reuniu-se para conseguir a alforria de outros escravos de Cachoeira.

Vale a pena conhecer a história da Irmandade, sua luta, obrigações, hierarquia e suas manifestações

 

BOA MORTE, UMA IRMANDADE DE EXALTAÇÃO À VIDA! 

                                                      AIYÊ-ORUN

A história da confraria religiosa da Boa Morte se confunde com a maciça importação de negros da costa da África para o Recôncavo canavieiro da Bahia, onde o gênio aventureiro ibérico edificou belas cidades como a de Cachoeira, segunda em importância econômica na Bahia durante três séculos. O fato de ser constituída apenas por mulheres negras, numa sociedade patriarcal e marcada por forte contraste racial e étnico, emprestou a esta manifestação afro-católica, como querem alguns, notável fama, seja pelo que expressa do catolicismo barroco brasileiro, de indeclinável presença processional na rua, seja por certa tendência para a incorporação aos festejos propriamente religiosos de rituais profanos pontuados de muito samba e rega-bofe. Há que acrescentar ao gênero e raça dos seus membros a condição de ex-escravos ou descendentes deles, importante característica social sem a qual seria difícil entender tanto aspectos ligados aos compromissos religiosos da confraria, onde ressalta a enorme habilidade dos antigos escravos para cultuar a religião dos dominantes sem abrir mão de suas crenças ancestrais, como também aqueles aspectos ligados à defesa, representação social (porque não?) política dos interesses dos adeptos.

Origem Remota e uma Luta Antiga

No Brasil Colonial e depois, já no país independente mas ainda escravocrata, proliferaram irmandades. Para cada categoria ocupacional, raça, nação – sim, porque os escravos africanos e seus descendentes procediam de diferentes locais com diferentes culturas – havia uma. Dos ricos, dos pobres, dos músicos, dos pretos, dos brancos, etc. Quase nenhuma de mulheres, e elas, nas irmandades dos homens, entraram sempre como dependentes para assegurarem benefícios corporativos advindos com a morte do esposo. Para que uma irmandade funcionasse, diz o historiador João José Reis, precisava encontrar uma igreja que a acolhesse e ter aprovados os seus estatutos por uma autoridade eclesiástica. Muitas conseguiram construir a sua própria Igreja como a do Rosário da Barroquinha, com a qual a Boa Morte manteve estreito contato. O que ficou conhecido como devoção do povo de candomblé. O historiador cachoeirano Luiz Cláudio Nascimento afirma que os atos litúrgicos originais da Irmandade de cor da Boa Morte eram realizados na Igreja da Ordem Terceira do Carmo, templo tradicionalmente freqüentado pelas elites locais. Posteriormente as irmãs transferiram-se para a Igreja de Santa Bárbara, da Santa Casa da Misericórdia, onde existem imagens de Nossa Senhora da Glória e da Boa Morte. Desta, mudaram-se para a bela Igreja do Amparo desgraçadamente demolida em 1946 e onde hoje encontram-se moradias de classe média de gosto duvidoso. Daí saíram para a Igreja Matriz, sede da freguesia, indo depois para a Igreja da Ajuda.

O fato é que não se sabe ao certo precisar a data exata de sua origem. Odorico Tavares arrisca uma opinião: a devoção teria começado mesmo em 1820, na Igreja da Barroquinha, tendo sido os gêges, deslocando-se até Cachoeira, os responsáveis pela sua organização. Outros ressaltam a mesma época, divergindo quanto à nação das pioneiras, que seriam alforriadas Ketu. Parece que o “corpus” da irmandade continha variada procedência étnica já que fala-se em mais de uma centena de adeptas nos seus primeiros anos de vida. Historicamente essa data parece fazer sentido. Desde o início do século passado o Recôncavo viveu uma atmosfera de progresso e novas técnicas agrícolas e industriais ali são introduzidas. Em que se pese as dificuldades momentâneas da economia açucareira, o fumo ganhou novo alento quando começa a interessar, após a independência política do país, ao capital alemão. A inauguração do serviço de navegação a motor favorece esses bafejos de renovação econômica, estimulando a integração do Recôncavo com a Capital da Província e o aumento dos seus negócios, o que favorece a construção de sólidos laços entre os negros escravos de muitas cidades, sobretudo de Salvador e Cachoeira. Jeferson Bacelar chama a atenção para o fato de que a década de 20 do século passado, sobretudo os seus três primeiros anos, é marcada por acentuado processo de agitação e acirramento dos ânimos da população baiana, boa parte da qual, sem distinção social, encontra-se envolvida na luta pela Independência, aqui caracterizada por forte espírito anti-lusitano e refregas armadas. O clima de distensão entre senhores e escravos, suscitado por essa “unidade”  momentânea, contribuiu para permanentes deslocamentos dos negros pelas cidades do Recôncavo, onde os senhores manifestaram incomum atenção na resolução do conflito e, para defenderem seus interesses, armaram os escravos e os utilizaram contra os portugueses. Dessa excepcional conjuntura resultaram inúmeras iniciativas religiosas e civis dos escravos, entre as quais, quem sabe, a própria Irmandade da Boa Morte. O pesquisador Antônio Morais Ribeiro associa seu surgimento às senzalas, apostando na conjuntura abolicionista pós-Revolta dos negros islamizados na Bahia que se deu em 1835 e foi barbaramente esmagada. Quem sabe daí o toque claramente muçulmano na morfologia tradicional dos trajes de grande força e rara beleza, realçados pelo uso do turbante, como assinala Raul Lody.

Antônio Morares acredita que uma das presumíveis líderes da Revolta Islâmica, Luiza Mahim, em pessoa, esteve envolvida na constituição da Irmandade, após a sua fuga de Salvador para o Recôncavo. Conjecturas à parte, estas confrarias – religiosas ou não – como foi o caso da estudada pelo antropólogo Julio Braga – a Sociedade Protetora dos Desvalidos – faziam mais do que cultuar santos católicos e orixás patronos dos seus afiliados. Ao tempo que aparentemente atendiam exigências eclesiásticas e legais, constituíam-se em verdadeiras associações de classe, reservadas, e por trás de suas aparências de fachadas davam curso aos interesses secretos dos seus membros. Respeitadas instituições de solidariedade eram a um só tempo expressão viva da permuta interétnica e ambíguo instrumento de controle social cujos participantes “administravam” criativamente. A confraria sempre obrigou aos seus membros a colaborarem. Jóias de entrada, anuidades, esmolas coletadas e outras formas de renda sempre foram usadas para os mais diversos fins: compra de alforria, realização de festejos, obrigações religiosas, pagamento de missas, caridade, vestuário. No caso da Boa Morte, integrada por mulheres bastante simples e quase todas idosas – entre 50 e 70 anos – os recursos arrecadados em vida buscaram sempre, a concessão de um funeral decente, cujo preparo, face a dupla militância religiosa de suas adeptas, exige rigor e entendimento, além de um certo pecúlio fúnebre.

As Obrigações Corporativas e a Manifestação de Agosto

A historiografia dessas notáveis mulheres cachoeiranas continua a desafiar a inteligência de jovens pesquisadores. Seus rituais secretos ligados ao culto dos orixás também estão a requerer leitura etnográfica que respeite, naturalmente, os limites à manutenção dos segredos, tão importantes na manutenção dessa vertente religiosa. O que tem ressaltado é o aspecto externo do culto referido quase todo ao simbolismo católico e a sua apropriação afro-brasileira. Durante o começo do mês de agosto, uma longa programação pública atrai a Cachoeira gente de todos os lugares, no que Moraes Ribeiro considera o mais representativo documento vivo da religiosidade brasileira, barroca, íbero-africana. Ceias, cortejos, missas, procissões, samba-de-roda colocam cerca de 30 remanescentes da Irmandade, que já possuiu mais de 200, no centro dos acontecimentos da provinciana cidade e, ultimamente, nos principais órgãos noticiosos da capital e tele-jornais. A festa propriamente dita tem um calendário que inclui a confissão dos membros na Igreja Matriz, um cortejo representando o falecimento de Nossa Senhora, uma sentinela, seguida de ceia branca, composta de pão, vinhos e frutos do mar obedecendo a costumes religiosos que interditam o acesso a dendê e carne no dia dedicado a Oxalá, criador do Universo, e procissão do enterro de Nossa Senhora da Boa Morte, onde as irmãs usam trajes de gala. A celebração da assunção de Nossa Senhora da Glória, seguida de procissão, em missa realizada na Matriz dá curso à contagiante alegria dos cachoeiranos que irrompe em plenitude, nas cores, comida e bastante música e dança que se prolongam por diversos dias, a depender dos donativos arrecadados e das condições de pecúlio do ano.

Hierarquia e Culto

Como todas as confrarias religiosas baianas, a Irmandade da Boa Morte possui uma estrutura hierárquica interna para gerir a devoção diária e doméstica de seus membros. A direção é composta por quatro irmãs responsáveis pela organização da festa pública de agosto e substituídas anualmente. No topo da administração da vida da Irmandade da Boa Morte está a Juíza Perpétua, posição de maior destaque e atingida por status adquirido, ocupada pela mais idosa adepta. A seguir, situam-se os cargos de Procuradora-Geral, Provedora, Tesoureira e Escrivã, estando a Procuradora à frente das atividades executivas religiosas e profanas. Para serem aceitas as noviças, além de estarem vinculadas a alguma casa de candomblé – geralmente Gêge, Ketu ou Nagô-Batá, na região – e professarem o sincretismo religioso, deverão se submeter a uma iniciação que impõe um estágio preparatório de três anos, conhecido pelo nome de “irmã da bolsa”, aonde é testada a sua vocação. Uma vez aceita, poderá compor algum cargo de diretoria e a cada três anos ascender na hierarquia da Irmandade. Não é demais lembrar que todas dividem irmanamente as atividades da cozinha, coleta de fundos, organização das ceias cerimoniais, das procissões do cortejo, além dos funerais das adeptas seguindo os preceitos religiosos e uma determinação estatutária tácita. As eleições são realizadas anualmente procedendo-se a apuração dos votos pelo curioso sistema de contagem de grãos de milho e feijão, indicando o primeiro atitude de rejeição e o segundo aceitação. Em que pese as diferenças hierárquicas e os preceitos relativos a cada posição, todas as irmãs estão niveladas como empregadas de Nossa Senhora. Além de irmãs de devoção, são algumas vezes, irmãs de santo e quase sempre “parentes” – os africanos e seus descendentes no Brasil alargaram o conceito de parentela estendendo o vínculo a todos aqueles que são filhos de uma mesma nação. É notável como a ancestralidade africana se reelabora no interior das instituições religiosas baianas e como as irmandades leigas acabam prestando renovado serviço a esse processo de intercurso cultural. É admirável que, a propósito de celebrarem a morte, essas mulheres negras cachoeiranas tenham sobrevivido com tanta majestade e garbo. O mais incrível é que o sistema de crenças tenha absorvido com tamanha funcionalidade e criatividade os valores da cultura dominante, realizando, em nome da vida, complexos processos de apropriação como o evidenciado na descida da própria Nossa Senhora à Irmandade, a cada ciclo de sete anos, para dirigir em pessoa os festejos, investida da figura de Procuradora-Geral, celebrando entre os vivos a relatividade da morte. Tais elementos podem ser constatados tanto na simbologia do vestuário, quanto nas comidas de preceito que evidenciam recorrentes ligações entre este (Aiyê) e o outro mundo (Orun), para utilizar aqui duas expressões já incorporadas à linguagem popular da Bahia. Assim como as confrarias, a devoção a Boa Morte foi muito comum na Bahia Colonial e Imperial. Sempre foi uma devoção popular. Na Igreja de Nossa Senhora do Rosário na Barroquinha ela ganhou expressão e consistência. Aliás, ali era um espaço de notável presença gêge-nagô e as características dos festejos descritos por cronistas como Silva Campos atestam sua semelhança com os praticados ainda hoje em Cachoeira. Deve-se dizer que ali teve origem uma das mais respeitáveis casas de candomblé da Bahia; fundada no século XVIII, a Casa Branca do Engenho Velho da Federação que vem sendo estudada com muito brilhantismo por Renato da Silveira. Devoção popular e mais que isso, racial, na medida em que agregou principalmente negros e mestiços. Suas origens remontam ao Oriente tendo sido adotada por Roma no século VII. Já dois séculos depois a festa da Assunção de Nossa Senhora está disseminada por todo o mundo católico. Trazida de Portugal para o Brasil – onde era conhecida como Nossa senhora de Agosto – ganhou interpretação peculiar, características próprias e por causa disso, a devoção sempre criou atritos com as autoridades da Igreja. Sua difusão entre a comunidade baiana, entre outras coisas, deveu-se ao fato de que a mediunidade popular característica dos cultos africanos sempre relativizou o problema da morte, na medida em que os adeptos do candomblé acreditam em reencarnações sucessivas. Emprestou, portanto, ao culto originalmente católico elementos do seu sistema de crenças e componentes sócio-históricos da dura realidade escravista que fez do cativeiro sofrível martírio para os que vieram na diáspora. De sorte que a devoção a Nossa Senhora da Boa Morte passou a ter também um significado social, permitindo a agregação dos escravos, facultando a manutenção de sua religiosidade num ambiente hostil e delimitando um instrumento corporativo de defesa e de valorização do indivíduo, tornando-se, por todas essas razões, um inigualável meio de celebração da vida.

GUSTAVO FALCON

(Professor da UFBA e pesquisador do Centro de Estudos Afro-Orientais)

 

Programação comemorativa do centenário de Jorge Amado

 

No próximo ano, o escritor Jorge Amado completaria 100 anos de idade. Para comemorar o centenário do nascimento do escritor, que apresentou a Bahia ao mundo por meio de personagens como ‘Gabriela’, ‘Dona Flor’, ‘Vadinho’, ‘Pedro Bala’, ‘Balduíno’, ‘Tieta’, entre outros, serão realizadas diversas homenagens em Salvador, Itabuna – onde ele nasceu -, Ilhéus e Vitória da Conquista, além de estados como São Paulo e Rio de Janeiro.

A programação especial do centenário apresentada na Fundação Casa de Jorge Amado, no Pelourinho, na quarta-feira (10), quando o escritor faria 99 anos, também marcou os 25 anos da instituição, que reúne todas as obras do homenageado. As homenagens têm apoio do Estado, por meio da Secretaria de Cultura (Secult), que está realizando diversas atividades para celebrar o Ano Jorge Amado, com programação até dezembro de 2012.

Já na quarta-feira (10), o escritor moçambicano Mia Couto esteve na Sala Principal do TCA, onde fez a palestra ‘Um Mar Vivo: Como Jorge é Amado em África’, propondo leitura africana da obra do escritor baiano. No Foyer do TCA, acontece a abertura da exposição ‘100 + 100’, com ilustrações feitas pelo artista plástico Carybé para a obra de Jorge Amado. A exposição também homenageia o artista plástico argentino radicado na Bahia, que completaria 100 anos em 2011, amigo e parceiro do escritor.

Colóquios de literatura

De acordo com a diretora executiva da Fundação Casa de Jorge Amado, Myriam Fraga, a programação também inclui colóquios de literatura, que começam este mês, relançamento de obras do autor, festival de gastronomia baiana, mostra de cinema, lançamento de catálogos temáticos de fotos de Jorge Amado com a família, amigos e no exílio.

Nas bibliotecas públicas, vão ser incluídos círculos de leitura, exibição de filmes acompanhada de debates, oficinas de arte literária, montagem de espetáculos e leituras em praças públicas. Uma das expectativas para as homenagens é a exposição itinerante ‘Jorge, amado e universal’, que inicialmente estará disponível ao público paulista, em março de 2012, no Museu da Língua Portuguesa. Logo depois, será aberta em Salvador, Pernambuco, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e em três países, ainda não definidos. “Se meu pai estivesse vivo, com certeza iria gostar muito destas comemorações, porque ele era festeiro, gostava de conversar, conhecer pessoas”, disse Paloma Amado, filha do escritor.

O secretário da Cultura, Albino Rubim, afirmou que a programação começou a ser elaborada desde o início do ano. Setores da sociedade civil e entidades culturais foram convidados para discutirem as atividades do Ano Jorge Amado.

Eventos para 2011

AGOSTO

Dia 15

Biblioteca Juracy Magalhães Júnior (Itaparica) – Exibição do documentário ‘Jorge Amado’ (60 minutos), do cineasta João Moreira Salles.

Dia 17

Biblioteca de Itaparica – Oficina literária sobre a representação do negro na obra ‘Tenda dos Milagres’ destinada aos alunos do ensino médio e pré-vestibulandos do município de Itaparica.

Dia 18

Casa Afrânio Peixoto (Lençóis) – Conferência ‘Jorge Amado: da ancestralidade à representação dos Orixás’, com o professor Gildeci de Oliveira Leite, diretor do Departamento de Ciências Humanas e Tecnologia (DCHT), da Universidade do Estado da Bahia (Uneb/Seabra).

Dias 28 e 29

Biblioteca Infantil Monteiro Lobato (bairro Nazaré, Salvador) – X Encontro do Programa Nacional de Incentivo à Leitura Salvador (Proler) com o debate do tema ‘Leituras e releituras de Jorge, o Amado’ e realização de oficinas, palestras, saraus literários sobre o trabalho do escritor.

OUTUBRO

10ª Bienal do Livro da Bahia – O evento, no Centro de Convenções da Bahia, prestigiará o Ano Jorge Amado, com lançamento de livros e realização de palestras, numa iniciativa da Secult, Secretaria de Educação (SEC) e empresa Fagga.

Salão Baiano de Turismo – Lançamento de roteiros turísticos na Bahia baseados na vida e obra de Jorge Amado.

NOVEMBRO

Lançamento do livro ‘Verger, Carybé e Jorge Amado’ – Responsáveis: Fundação Pierre Verger e Fundação Casa de Jorge Amado.

Lançamento do livro ‘Jorge Amado: 88 anos de vida e obra’ – Edição atualizada e revisada de ‘Jorge Amado 80 anos de vida e obra: subsídios para pesquisa’. Responsáveis: Editora da Ufba (Edufba) e a Fundação Pedro Calmon

DEZEMBRO

Dia 16

Palestra ‘Jorge Amado: o escritor de Orixás e Candomblés da Bahia’ – O palestrante será o professor de literatura brasileira, Gildeci de Oliveira Leite. Responsáveis: Casa Afrânio Peixoto e Universidade do Estado da Bahia (Uneb /Seabra)