Profundamente
Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci.
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
(Manuel Bandeira)
Não há na língua portuguesa nenhum poema relativo ao São João como este de Manuel Bandeira!!! Nenhum com a intensidade humana deste. Não era ‘poeta menor’: era poeta que escrevendo poemas como este elevou a língua portuguesa e nos ajudou a aceitar o destino comum. Obrigado aqui de Portugal!
Festa de São João
Não há moça sem beleza,
Não há rico sem riqueza,
Sem rio não há floresta,
Não há pasto sem capim,
Não há verso sem seu fim ,
Não há são João sem festa ,
Tudo que Bandeira escreve é intenso, profundo,
embora traga uma carga de tristeza relacionada à própria vida. Esse é um dos meus preferidos.
Beijos, Leni.
Bonito poema, embora um pouco triste…
Leni,
Maravilhoso o poema de Manoel Bandeira.
Aqui nem fogos escuto.
Feliz São João.
Beijos,
Iara
Eu já o conheço há muito tempo, Iara. Mas somente ontem pude me dar conta da mensagem que ele encerra. Obrigada pela visita!